quinta-feira, 10 de maio de 2018

DETESTO TUDO QUE IMPLICA NA IDEIA DE FORMAÇÃO DE BANDOS

Revisitando Adélia Prado, percebo mais de perto, que a sua conversação com a religião é de um jeito não opressivo.Adélia nunca é submissa, pelo contrário, é quase subversiva. Temos aproximações: Eu falo de um DEUS que queria que amasse, Adélia fala de um DEUS que ama.Mas ela se revolta, ela é carne e isso é cobrado dela.Na verdade ela usa o nome de DEUS para explicar seu amor. Adélia é uma criadora poderosa, nunca suave, com aquela coisa dolorosa que brota do solo pedregoso do lugar onde vive. Fica-me o que talvez seja o coração da sua obra, marca da sua importância: a descoberta do sagrado no cotidiano.Vivemos num mundo tão despido de mistério e magia, que nos enredamos numa confusa e triste banalização das coisas. O desejo de transcendência procura saciar-se no culto ao corpo, da droga, do álcool, do dinheiro. Não precisávamos recorrer a esses expedientes: o mundo é santo. Basta apurar o ouvido, sossegar um pouco o coração, sustar as ansiedades. Fazer como Adélia, que na sua pequena Divinópolis, rodeada de filhos e objetos domésticos, enfiou raízes na terra e antenas em DEUS; e percebeu a união (re-ligare, religião) de tudo isso. Ler Adélia faz chorar. Não de dor, mas de beleza: "O QUE É BONITO ENCHE OS OLHOS DE LÁGRIMAS". FICAMOS HUMILDES DIANTE DO SEU TEXTO. SEU TEXTO É UM DOS MAIS HUMANOS QUE CONHEÇO.. Nos peixes, na horta, na cesta de tomates e cebolas, limpando a sala com uma fita atada ao cabelo, Adélia encontra DEUS: um DEUS encarnado e humanizado, presente e misterioso, que lhe dá alegrias, mas também terrores: " não beija o rosto, e ainda exige a outra face para o bofetão". Faz poemas de amor para Ele como os faz para o marido.E sofre por Ele como por uma pessoa amada . Adélia vive em espanto e êxtase o paradoxo de DEUS que " não me fez até a cintura para o diabo fazer o resto".QUE REPOUSO, QUE CONFORTO, PENSAR QUE ADÉLIA EXISTE. Adélia, que detesta restaurante sofisticado mas lê SÃO JOÃO DA CRUZ, nos dá um baque no estômago, um choque no coração, um soco na cara , com seus textos varados de luz, cheirando a comida e incenso, dizendo- nos a toda hora "MUNDO É SANTO, A VIDA É DIFÍCIL MAS DEUS ESTÁ NELA, DURA CARGA, AMOR PROFUNDO". Adélia, mãe de filhos, esposa, querendo justiça para sua gente e seu país, doente de um complexo e generalizado amor, nos domingos "bate o osso no prato pra chamar o cachorro". Mas é a DEUS que invoca, e tenho certeza de que, no fundo do seu quintal, a voz dele responde : ADÉLIA! E ela nem se espanta mais.

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