quinta-feira, 10 de maio de 2018

HOMENAGEM A MANOEL DE BARROS

MANOEL de BARROS, um poeta que se encontra às vezes com os trastes. E na escória às vezes passeia. Sua retina está fixada no chão , no solo. Ao que parece, escolheu semelhante território com tamanha ênfase até o ponto que o chão e os seres e coisas que o compõem, em sua poesia, assumem a mesma dimensão de um cosmo. Um poeta que canta as coisas e seres mínimos do chão com enorme intensidade. O chão da lua não o atrai... Lá não existe morrinhos de formigas,orvalho,córregos e árvores carregadas de passarinhos.Manoel areja as palavras, não deixando que morram de clichês. Pega as mais prostituídas pelos lugares comuns e lhes dar novas sintaxes, novas companhias.Coloca ,por exemplo , ao lado de uma palavra solene um pedaço de esterco.Ele constantemente reaprende a errar a língua, como exercício para devolver a inocência da fala. Ele é um enamorado da pintura de WEGA NÉRY, por quem se sente arrebatado e por isso um iluminador da sua poesia. Segundo ele, a pintura de WEGA, tem muitas águas guardadas que se empoemam e cacimbas azuis remansam em suas paisagens de sonho. Manoel de Barros aposta na inocência artística: a poesia das crianças e loucos, o canto dos pássaros e feridas borboletas fazendo propostas de cores tortas. As falas em "Cobra Norato" de RAUL BOPP, os atoledos vesgos,a lama lívida dos igarapés e as árvores prenhes produziram em sua alma enorme repercussão. Apaixonou-se pela desarrumação linguística estruturada, contida em " SERAFIM PONTE GRANDE " , de OSWALD DE ANDRADE... Nos dá a impressão que sentiu-se em um banquete a provar o sabor de gênio e susto, o "EU" , de Augusto dos Anjos. Manoel de BARROS remete-me a Jorge de Lima : Estão aqui as pobres coisas: cestas
esfiapadas, botas carcomidas,bilhas
arrebentadas, abas carcomidas,
com seus olhos virados para os que
as deixaram sozinhas, desprezadas,
esquecidas com outras coisas, sejam:
búzios, conchas, madeiras de naufrágio,
penas de ave e penas de caneta,
e outras pobres coisas, pobres sons,
coitos findos, engulhos, dramas tristes,
repetidos, monótonos, exautos,
visitados tão só pelo abandono,
tão só pela fadiga em que essas ditas
coisas goradas e órfãs se desgastam.

Isso está na "INVENÇÃO DE ORFEU" , Canto V. Poemas das Vicissitudes. E ocorre-me também um verso de LORCA " una gota de sangre de pato bajo las mutiplicaciones" ( poeta en Nueva York) onde LORCA engrandece o ínfimo. Uma gota de sangue de pato no asfalto de Nova York é uma ínfima coisa que arrebatou o poeta.

Para MANOEL DE BARROS, engrandecer as coisas menores através da linguagem é uma das funções da poesia.

Em breve, e chegando de mansinho, CONCERTO DE ASSOBIOS, baseado na poética de MANOEL DE BARROS e CÂNTICOS DE TRABALHO.

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