MANOEL de BARROS, um poeta que se encontra às vezes com os trastes. E
na escória às vezes passeia. Sua retina está fixada no chão , no solo. Ao que
parece, escolheu semelhante território com tamanha ênfase até o ponto que o
chão e os seres e coisas que o compõem, em sua poesia, assumem a mesma
dimensão de um cosmo. Um poeta que canta as coisas e seres mínimos do chão
com enorme intensidade. O chão da lua não o atrai... Lá não existe
morrinhos de formigas,orvalho,córregos e árvores carregadas de
passarinhos.Manoel areja as palavras, não deixando que morram de clichês.
Pega as mais prostituídas pelos lugares comuns e lhes dar novas sintaxes,
novas companhias.Coloca ,por exemplo , ao lado de uma palavra solene um
pedaço de esterco.Ele constantemente reaprende a errar a língua, como
exercício para devolver a inocência da fala. Ele é um enamorado da pintura de
WEGA NÉRY, por quem se sente arrebatado e por isso um iluminador da sua
poesia. Segundo ele, a pintura de WEGA, tem muitas águas guardadas que se
empoemam e cacimbas azuis remansam em suas paisagens de sonho. Manoel de
Barros aposta na inocência artística: a poesia das crianças e loucos, o canto
dos pássaros e feridas borboletas fazendo propostas de cores tortas. As falas
em "Cobra Norato" de RAUL BOPP, os atoledos vesgos,a lama lívida
dos igarapés e as árvores prenhes produziram em sua alma enorme repercussão.
Apaixonou-se pela desarrumação linguística estruturada, contida em "
SERAFIM PONTE GRANDE " , de OSWALD DE ANDRADE... Nos dá a impressão que
sentiu-se em um banquete a provar o sabor de gênio e susto, o "EU"
, de Augusto dos Anjos. Manoel de BARROS remete-me a Jorge de Lima : Estão
aqui as pobres coisas: cestas
esfiapadas, botas carcomidas,bilhas arrebentadas, abas carcomidas, com seus olhos virados para os que as deixaram sozinhas, desprezadas, esquecidas com outras coisas, sejam: búzios, conchas, madeiras de naufrágio, penas de ave e penas de caneta, e outras pobres coisas, pobres sons, coitos findos, engulhos, dramas tristes, repetidos, monótonos, exautos, visitados tão só pelo abandono, tão só pela fadiga em que essas ditas coisas goradas e órfãs se desgastam. Isso está na "INVENÇÃO DE ORFEU" , Canto V. Poemas das Vicissitudes. E ocorre-me também um verso de LORCA " una gota de sangre de pato bajo las mutiplicaciones" ( poeta en Nueva York) onde LORCA engrandece o ínfimo. Uma gota de sangue de pato no asfalto de Nova York é uma ínfima coisa que arrebatou o poeta. Para MANOEL DE BARROS, engrandecer as coisas menores através da linguagem é uma das funções da poesia. Em breve, e chegando de mansinho, CONCERTO DE ASSOBIOS, baseado na poética de MANOEL DE BARROS e CÂNTICOS DE TRABALHO. |
quinta-feira, 10 de maio de 2018
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