quarta-feira, 16 de maio de 2018
quinta-feira, 10 de maio de 2018
MANOEL de BARROS, um poeta que se encontra às vezes com os trastes. E
na escória às vezes passeia. Sua retina está fixada no chão , no solo. Ao que
parece, escolheu semelhante território com tamanha ênfase até o ponto que o
chão e os seres e coisas que o compõem, em sua poesia, assumem a mesma
dimensão de um cosmo. Um poeta que canta as coisas e seres mínimos do chão
com enorme intensidade. O chão da lua não o atrai... Lá não existe
morrinhos de formigas,orvalho,córregos e árvores carregadas de
passarinhos.Manoel areja as palavras, não deixando que morram de clichês.
Pega as mais prostituídas pelos lugares comuns e lhes dar novas sintaxes,
novas companhias.Coloca ,por exemplo , ao lado de uma palavra solene um
pedaço de esterco.Ele constantemente reaprende a errar a língua, como
exercício para devolver a inocência da fala. Ele é um enamorado da pintura de
WEGA NÉRY, por quem se sente arrebatado e por isso um iluminador da sua
poesia. Segundo ele, a pintura de WEGA, tem muitas águas guardadas que se
empoemam e cacimbas azuis remansam em suas paisagens de sonho. Manoel de
Barros aposta na inocência artística: a poesia das crianças e loucos, o canto
dos pássaros e feridas borboletas fazendo propostas de cores tortas. As falas
em "Cobra Norato" de RAUL BOPP, os atoledos vesgos,a lama lívida
dos igarapés e as árvores prenhes produziram em sua alma enorme repercussão.
Apaixonou-se pela desarrumação linguística estruturada, contida em "
SERAFIM PONTE GRANDE " , de OSWALD DE ANDRADE... Nos dá a impressão que
sentiu-se em um banquete a provar o sabor de gênio e susto, o "EU"
, de Augusto dos Anjos. Manoel de BARROS remete-me a Jorge de Lima : Estão
aqui as pobres coisas: cestas
esfiapadas, botas carcomidas,bilhas arrebentadas, abas carcomidas, com seus olhos virados para os que as deixaram sozinhas, desprezadas, esquecidas com outras coisas, sejam: búzios, conchas, madeiras de naufrágio, penas de ave e penas de caneta, e outras pobres coisas, pobres sons, coitos findos, engulhos, dramas tristes, repetidos, monótonos, exautos, visitados tão só pelo abandono, tão só pela fadiga em que essas ditas coisas goradas e órfãs se desgastam. Isso está na "INVENÇÃO DE ORFEU" , Canto V. Poemas das Vicissitudes. E ocorre-me também um verso de LORCA " una gota de sangre de pato bajo las mutiplicaciones" ( poeta en Nueva York) onde LORCA engrandece o ínfimo. Uma gota de sangue de pato no asfalto de Nova York é uma ínfima coisa que arrebatou o poeta. Para MANOEL DE BARROS, engrandecer as coisas menores através da linguagem é uma das funções da poesia. Em breve, e chegando de mansinho, CONCERTO DE ASSOBIOS, baseado na poética de MANOEL DE BARROS e CÂNTICOS DE TRABALHO. |
Viver é jogo, é risco. Quem joga pode ganhar ou perder. O começo da sabedoria
consiste em aceitarmos que perder também faz parte do jogo. Quando isso
acontece, ganhamos alguma coisa de extremamente precioso: ganhamos nossa
possibilidade de ganhar. Se sei perder , sei ganhar. Se não sei perder , não
ganho nada, e terei sempre as mãos vazias. Quem não sabe perder, acumula
ferrugem nos olhos e se torna cego - cego de rancor. Quando a gente chega , com
verdadeira e profunda humildade, as regras do jogo existencial, viver se torna
mais do que bom - se torna fascinante. Viver bem é consumir - se, é queimar os
carvões do tempo que nos constitui. Somos feitos de tempo, e isto significa :
somos passagem, movimento sem trégua, finitude. A cota de eternidade que nos
cabe está encravada no tempo. É preciso garimpá - la, com incessante coragem,
para que o gosto do seu ouro possa fulgir em nosso lábio. Se assim acontece,
somos alegres e bons , e a nossa vida tem sentido.
Escrever e criar constituem para mim uma experiência radical de nascimento. A
gente, no fundo, tem medo de nascer, pois nascer é saber - se vivo e - como tal
- exposto a morte . Escrevo menos do que devo para - quem sabe ? - manter a
ilusão de que tenho um tempo longo pela frente . A meu favor, posso dizer que,
com frequência, agarro - me pelas orelhas e me ponho ao trabalho.
Há no diário de KAFKA , um pequeno trecho ao qual gostaria de permanecer para
sempre fiel, fazendo dele a minha fórmula de vida : "... Há dois pecados
humanos capitais dos quais todos os outros decorrem :a impaciência, e a
preguiça . Por causa de sua impaciência , foi o homem expulso do Paraíso . Por
causa de sua preguiça , não retornou a ele ...". Talvez não exista senão
um pecado capital, a impaciência . Por causa da impaciência, foi o homem
expulso, por causa dela não consegue voltar. Tenhamos paciência - uma longa,
interminável paciência - e tudo nos será dado por acréscimo.
Sou um homem de muitos amores - isto é, de muitos interesses - e, para tão
longos amores, tão curta é a vida. Não há ninguém que consiga, no tempo de uma
vida, esgotar todas as suas possibilidades. Se me fossem dadas outras e outras
vidas, gostaria de ser : filósofo profissional , romancista, guerrilheiro ,
chofer de caminhão, dono de loja de disco, morar numa casinha lá na Marambaia
apaixonado por um moço triste , debruçado à janela de uma casa saída de quadro
de Volpi, cobrador de ônibus, ter um caso de amor com Cora Coralina , a quem me
dedicaria com veludosa e insone dedicação, ser seresteiro poeta e cantor.
Para mim, a coisa mais importante do mundo é a possibilidade de ser- com - o -
outro, na calma, cálida e intensa do amor. O outro é o que importa, antes e
acima de tudo. Por mediação dele,na medida em que o recebo em sua graça,
conquisto para mim a graça de existir. É esta a fonte de verdadeira
generosidade e do autêntico entusiasmo - Deus - comigo. O amor genuíno ao Outro
me leva à intuição do todo e me compele à luta pela justiça e transformação do
mundo.
Ah! o amor é surpresa, susto esplêndido - descoberta do mundo. Amor é dom
demasia presente. Dou -me ao Outro e, aberto à sua alteridade, por mediação
dele , recebo dele o dom de mim, a graça de existir, por ter - me dado.
Deus é o ser em si mesmo, fundamento de todos os entes, abismo insondável de
cujas profundezas todos os entes brotam. Deus é a raiz última de todas as
coisas. A glória , a graça e o mistério de todas as coisas decorrem da presença
do sagrado nelas - sinal de sua providência.
Qualquer experiência em profundidade é , ao meu ver, uma experiência
autenticamente religiosa - conhecimento de Deus.
Bom dia sempre!!!!
ESTOU CERTO DE QUE ATÉ AGORA NÃO INVENTOU-SE MELHOR CONVÍVIO SOCIAL DO QUE
AQUELE TRAZIDO PELA TRADIÇÃO DEMOCRÁTICA.
Sempre achei muito ruim encararem a diferença de maneira hierárquica, fazendo
desta hierarquia intolerância e perseguição aos supostos inferiores. Quanto a isso,
tenho sobretudo o que se poderia chamar, um pensamento mais caseiro... Aí, não
sei se trata-se de questões subjetivas mais profundas minhas, se são as minhas
histórias de classe( no plural mesmo), o meu nascimento no Nordeste do
Brasil... Para mim, é impossível lidar com coisas que não têm relação com isso.
Fico me sentindo retórico , tenho a impressão de estar em conversa de salão.
Quando penso nestas questões, o que resulta, se revela em algo extremamente
vital , que implica "dores" minhas e do outro. Sinceramente, o que
hoje me interessa é a minha aproximação com tudo aquilo que traz e inscreve-se
na dimensão da diferença.Isso possibilita me demarcar, de ter um total
interêsse pelo que é humano e não pelo que é uma extrapolação, uma imagem
etérea do humano.Estou convencido do pensamento plural. Estou certo de que até
agora não inventou-se melhor convívio social do que aquele trazido pela
TRADIÇÃO DEMOCRÁTICA, quer dizer, aquele em que as idéias proliferam e são
livremente discutidas. É evidente que essa posição pragmática tem um limite. No
entanto é muito difícil me libertar dessa preocupação e pensar em questões um
tanto mais abstratas. Imagine, se todo mundo fosse como eu, que pobreza de
idéias o mundo teria! ESTE É O MEU LIMITE. SÓ RESPEITANDO O PRÓPRIO LIMITE E
FUNCIONANDO DE ACORDO COM O QUE SE PENSA É QUE SE PODE ACRESCENTAR UMA PEDRA A
MAIS NA CONVERSAÇÃO DA HUMANIDADE. ISTO SIGNIFICA DILATAR OS HORIZONTES DOS
POSSÍVEIS E TENTAR INVENTAR MUNDOS OU ALTERNATIVAS DE MUNDOS VIÁVEIS. Isto é
que faz grande parte do que considero CONDIÇÃO HUMANA. Humberto Eco, no pós -
escrito do "NOME DA ROSA" diz que todo escritor tem seu
interlocutor-cúmplice. Mas também posso aqui pensar, que os opositores são
fundamentais. E desta forma , quais seriam os meus cúmplices e os meus
opositores? Meus interlocutores cúmplices são todas aquelas pessoas que estejam
preocupadas em pensar o PARTICULAR OU A DIFERENÇA entre particulares. Meus
opositores , nessa conversação são os pensadores do UNIVERSAL. Estou sempre
perguntando a eles como é que acham que podem passar por cima das sombras, da
contingência histórica para pensar o sopro, o etéreo, a essência d'aquilo que
seria verdadeiramente humano. Todo grupo pensa os seus fundamentos, pensa o que
é verdadeiro em função de uma determinada tradição, de valores dos quais ele
não pode escapar, quer dizer,em função dos seus mitos de origem. O que se pode
é , admitindo essa contingência, dizer aos demais: " Veja só o que penso e
como penso em função daquilo que tenho como herança cultural. O que é que você,
que tem outra tradição acha disso? O que me propõe? É através desse diálogo que
se pode fazer proliferar as alternativas e modos de vida. Todos temos direito a
auto-realização, a fazer de sua vida uma obra de arte!